Um café com… Francisco Donoso, Managing Director na DOLAF Servicios Verdes e presidente do BIR (Bureau of International Recycling)
Sou biólogo e MBA. Tenho 58 anos e ingressei numa pequena empresa familiar, fundada pelo meu pai, dedicada à recuperação e reciclagem de papel e cartão.
Fomos pioneiros no desenvolvimento das recolhas seletivas municipais de papel e cartão usado, contando com contentores e camiões cedidos pelo então MOPU, em 1993. Desde então, a empresa continuou a crescer e, nos anos 2000, iniciou a sua aventura internacional, exportando cartão recuperado para a China e outros países do Sudeste Asiático.
Em 2012, a minha família decidiu vender a empresa a uma multinacional alemã líder no seu setor, o ALBA GROUP, da qual fizemos parte até 2021, ano em que voltei a comprar a empresa sozinho, sendo agora o único acionista.
Empack e Logistics & Automation Porto: Francisco, conte-nos um pouco o que é a DOLAF Serviços Verdes e como é o seu dia a dia a conciliar o cargo na empresa com a presidência do BIR (Bureau of International Recycling).
Francisco: A DOLAF Serviços Verdes é uma empresa que mantém o seu core business original — a recuperação e reciclagem de papel e cartão usado — para posterior comercialização, tanto a nível local como internacional. No entanto, a empresa diversificou a sua oferta de serviços, acompanhando a procura do mercado, que tende a unificar vários serviços semelhantes numa única entidade gestora. Assim, também recuperamos embalagens e outros materiais residuais, com o mesmo objetivo: a sua reciclagem. Temos uma elevada taxa de penetração em serviços públicos, graças às garantias e certificações que oferecemos, e destacamo-nos em serviços muito específicos, como a destruição de papel confidencial (com dados pessoais), reciclando posteriormente o material triturado em condições de alta segurança.
A minha atividade no BIR decorre em paralelo, tendo como principal objetivo promover a reciclagem de papel e cartão, protegendo sempre o livre mercado internacional, de forma a poder abastecer os mercados mais carenciados e evitar excesso de resíduos nos mercados com maior capacidade de recuperação. Estes objetivos são partilhados pela DOLAF, pelo que o trabalho é compatível e complementar.
Empack e Logistics & Automation Porto: Se estivéssemos a tomar este café em Bruxelas, em vez de Madrid, sobre o que se estaria a falar atualmente no que diz respeito à reciclagem e à legislação europeia? Considera que o consumidor final está verdadeiramente informado sobre o que acontece aos resíduos que separa? O que podemos fazer melhor para fechar esse ciclo?
Francisco: Tomo café em Bruxelas com frequência, e falamos muitas vezes sobre estes temas. Atualmente, estamos especialmente preocupados com a nova Diretiva sobre o transporte transfronteiriço de resíduos, que limita e restringe substancialmente o livre mercado internacional, impondo novos entraves, como a obrigatoriedade de auditorias externas nas fábricas asiáticas consumidoras do nosso papel residual — auditorias que não são exigidas às fábricas europeias, apenas por estarem localizadas na Europa. A condição de “fim de resíduo” (EoW) poderia ser uma solução, passando o nosso material a ser considerado como matéria-prima (que efetivamente é), em vez de resíduo, evitando assim as restrições ao mercado internacional.
Passo a explicar: a maior produção de bens de consumo a nível mundial está localizada na Ásia. É lá que é necessário fabricar o maior volume de embalagens para esses produtos. No entanto, esses produtos acabam por ser exportados para o mundo ocidental, onde as embalagens se tornam num resíduo desnecessário e excessivo, que nem sequer é contabilizado (contabilizam-se os produtos exportados, mas não as suas embalagens). Esta realidade, que vai além da nossa própria atividade, faz com que, na Europa, recuperemos um excesso de quase 8 milhões de toneladas anuais de resíduos de embalagens de cartão, que não foram fabricadas na Europa e que não podem ser recicladas cá, por falta de capacidade industrial e de mercado suficiente.
Por outro lado, os países asiáticos exportadores de bens de consumo continuam a necessitar de fabricar novas embalagens, para o que precisam de matérias-primas — que são precisamente os nossos excedentes de embalagens residuais. É assim que se fecha o ciclo, e não através da restrição do livre mercado internacional.
Empack e Logistics & Automation Porto: A partir da sua posição no BIR, Francisco, como está a perceber o impacto das tarifas dos EUA no comércio global de materiais reciclados? De que forma isso afeta as empresas espanholas ou europeias?
Francisco: Ainda é muito difícil quantificar, a única evidência é que as tarifas prejudicam sempre o livre mercado internacional, tão necessário no nosso setor, como acabei de explicar.
Os EUA e a Europa são os principais países exportadores de cartão recuperado para o mercado asiático, mas a China não importa este material. Assim, os nossos destinos principais são a Índia, Indonésia, Vietname, Malásia e Taiwan, que fabricam as suas próprias embalagens e, por sua vez, exportam bobinas de papel novo para a China, para que também fabriquem as suas embalagens. Se a exportação de bens de consumo da Ásia para os EUA for reduzida pelas tarifas, a procura de cartão recuperado nesses países para fabricar embalagens diminuirá, prejudicando as nossas exportações e agravando o problema do excesso de resíduos de embalagens em Espanha e na Europa — que continuariam a importar bens de consumo asiáticos embalados.
Empack e Logistics & Automation Porto: Com a nova legislação europeia sobre embalagens e resíduos de embalagens (PPWR), como considera que irão mudar os padrões de reciclabilidade ou reutilização? Estamos preparados em Espanha para nos adaptarmos?
Francisco: Sim, estamos a preparar-nos de forma eficiente. Já temos experiência com a anterior Lei de Embalagens e Resíduos de Embalagens, e neste caso trata-se de uma ampliação dos canais já existentes e de outros novos que estão a entrar em funcionamento. A taxa de reciclagem e a sua qualidade irão melhorar, mas continuamos a precisar de um mercado onde possamos comercializar este material — que é matéria-prima se for exportado para países que dele necessitam, mas que é considerado resíduo se o ciclo não for fechado.
Empack e Logistics & Automation Porto: Com conteúdos congressuais relevantes e soluções para otimizar a cadeia de valor das empresas, quais considera serem as maiores vantagens de contar com feiras como a Empack para o nosso tecido industrial?
Francisco: É fundamental divulgar informação completa e validada entre os profissionais do setor, conhecer dados estatísticos, identificar oportunidades, alargar a nossa rede de contactos e familiarizar-nos com a legislação aplicável. Tudo isto está muito concentrado neste tipo de eventos. Sem eles, o tempo, as deslocações e a investigação pessoal necessários seriam incomparavelmente maiores, e nunca tão relevantes.
Empack e Logistics & Automation Porto: Depois de todos estes anos de experiência, que mensagem gostaria de transmitir às novas gerações que estão a formar-se em sustentabilidade ou reciclagem?
Francisco: A mensagem fundamental é que o planeta tem limitações, não é infinito, e devemos otimizá-lo. A reciclagem de resíduos é a forma mais eficiente de reduzir o consumo de matérias-primas virgens e de evitar a saturação do planeta com resíduos indesejáveis.
No caso do papel/cartão, por exemplo, a reciclagem de uma tonelada implica evitar o abate de cerca de 17 árvores adultas para obter fibra de celulose, poupar 3 metros cúbicos de espaço em aterros, evitar a emissão de 1,2 toneladas de CO₂ (em comparação com a produção de fibra virgem), reduzir o consumo de 4 100 kWh e poupar cerca de 32 mil litros de água.
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